segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Marlice Zonzin


Conheçam Marlice Zonzin, mãe de Bianca, autista de 37 anos. Marlice é diretora social da Apadem, em Volta Redonda e apresentou, neste ano de 2012, um projeto esportivo e social à secretaria de Esportes beneficiando autistas menores e adultos. Este projeto recebeu total aprovação do prefeito e seus primeiros contatos com a secretaria já foram feitos. Marlice nos detalha com leveza e alegria, suas brilhantes experiências com Bianca. Seu positivismo e perseverança são contagiantes e exemplos a serem seguidos por todos.

Quando Bianca estava com 06 meses, notei algo estranho, mas jamais imaginei que fosse autismo, pois não conseguia relacionar o que via com a síndrome e pensei que fosse coisa de criança. Até hoje, ela faz um trejeito com a boca e bate as mãos na água quando está na piscina. Bianca é autista clássica com muitas ecolalias e esteriotipias e eu sou sua terceira mãe. Deixe-me explicar melhor: sua mãe biológica estava passando por nossa cidade e foi acolhida por uma assistente social na hora do parto. Bianca escolheu nossa cidade para nascer! Segundo relatos do hospital, seus pais seguiram seus destinos e a deixaram para adoção, pois eram pobres andarilhos e não tinham a menor condição de cuidar dela. Doze dias depois, meus pais pegaram a guarda de Bianca. Minha mãe tinha mais de 50 anos naquela época e foi tudo muito difícil, pois a adoção levou muito tempo para ser regularizada.
Bianca foi diagnosticada com autismo aos 05 anos, o que deixou minha mãe sem chão. Foram várias tentativas em escolinhas regulares, tratamento com fono, psicóloga, psiquiatra, remédios etc. Uma verdadeira catástrofe! Bianca piorou e a família perdeu mais ainda o norte. Ninguém sabia para onde ir…
Nesta época, eu terminei minha faculdade e me casei. Comecei minha vida com meu marido e tive dois filhos. Meus pais se viraram bastante sem minha presença contínua e eu sem a deles. Eu acompanhei todas as fases da vida de Bianca, mas quando meus filhos eram pequenos foi uma fase difícil para todos, principalmente, na questão da presença e assessoria, pois as tarefas eram muitas.
Os amigos e familiares comentavam sempre que minha mãe estava errada por ter adotado alguém com “problemas” e isto a entristeceu, deixou-a introspectiva e a fez perder o círculo de amizades. Minha mãe, que tinha problemas cardíacos, faleceu em junho de 2011, aos 84 anos. Meu pai, já com um câncer de medula, faleceu aos 86 anos… Estes foram os meses mais difíceis e mais tristes de minha vida, pois nesta época Bianca não reconhecia mais a figura de meu pai, porque o câncer o desfigurara. Ela tinha crises e mais crises e queria a mãe, que já havia falecido. Nesta época, confesso que achei que não iria suportar… Mas pude contar com o apoio de meu marido, que aceita minha irmã e gosta muito dela. Meus filhos não moram mais conosco, pois já são casados e têm suas vidas, porém, me apoiam muito. Quando eu preciso, minha filha, que mora mais perto, e minha empregada me auxiliam. Posso garantir que, indiscutivelmente, todos aceitam e gostam demais da “Bi”, (esse é seu apelido carinhoso).
Para termos qualidade de vida, decidimos que deveríamos encarar a sociedade, pois percebemos que as pessoas não se acostumam ao diferente. Mas isto não me abala, ao contrário, minhas campanhas de conscientização não são para que todos passem a encarar o que não entendem, mas somente para compreenderem o que existe. Ter em casa uma pessoa especial, nos dá um trabalho extra, principalmente quando estamos em idade de aposentadoria e aquele “aproveitar a vida”, que todos comentam. Contudo, estamos aproveitando cada minuto de nossas vidas sim, e incluímos a Bianca em nossas viagens, nosso lazer e em nossas vidas. Apesar de Bianca ser completamente ligada a rotinas, adora passear, então passeamos!
Minha dificuldade maior é encontrar ou confiar em uma babá, pois as pessoas não entendem bem o que se passa com um autista. Ainda mais para cuidar de uma autista tão grandona e seletiva, pois Bianca é bem seletiva no que diz respeito a pessoas. Por isso, trabalho muito para dar a ela um convívio de mais segurança e assim ela passará a aceitar melhor as pessoas e as mudanças, que a propósito, estão grandes nestes últimos meses, pois eu e meu marido também precisamos dos nossos momentos, claro! 
Os progressos acontecem, mas são lentos. Às vezes, uma conquista que levou anos desmorona em minutos. Mas, ela tem aceitado bem e eu tenho dedicado muitas horas dos meus dias para que ela tenha bastante segurança, o que é facilitado pelo fato de ela gostar muito de mim!
Há momentos em que me sinto impotente diante dos fatos, como explicar onde estão papai e mamãe, ou vê-la sem atividades, ver que, como ela, muitos autistas adultos não tiveram oportunidades, seja por falta de políticas públicas ou pelo fato de nossa ignorância em não saber o que realmente era autismo e como tratar na época. Apesar de que meus pais tentaram de tudo e não lhe foram negados tratamentos.
Acredito que um autista bem assessorado, com atividades regulares, tratamento multidisciplinar, carinho, atenção, amor e muitas terapias direcionadas com profissionais capacitados e que entendam bem do problema, ao menos para mim, representa uma cura. Para ser bem franca, acredito em cura para o autismo. Mesmo que não haja nada por parte da ciência e também não acredito em psicotrópicos, pois creio que estes mascaram comportamentos ou levam a outras crises, por conta de seus efeitos colaterais, que devem ser muito difíceis de serem descritos por um autista. Minha irmã fez um trabalho de desintoxicação a base de exercícios, em que deixou todos os medicamentos que tomava. Ou seja, ela passou a ter atividades e não precisou mais ser medicada.
Quando eu não conhecia nada sobre o assunto, pensei que pelo fato de ter pais andarilhos, e talvez alcoólatras ou drogados, sem suplementos vitamínicos, que eles fossem os “culpados”. Hoje, peço perdão a Deus todos os dias, pela minha ignorância e rezo por esta mãe, que mesmo querendo, não pode cuidar de sua filha. O que acho hoje em dia é que os poluentes e os fatores genéticos sejam a causa.
Uma das coisas que me trouxe alegrias foi poder fazer parte de uma associação, conhecer pessoas com os mesmos questionamentos e entender a respeito de autismo. Minha irmã está melhor graças ao meu entendimento, mesmo ainda não sendo tanto conhecimento, porque tenho mais confiança e segurança, logo vivemos melhor e mais felizes. Quanto mais eu entender sobre autismo, mais desenvolvimento minha irmã terá.
Apesar de toda a luta, minha irmã também me diverte muito quando está de muito bom humor. Ela fala coisas engraçadas que, mesmo sem nexo, nos diverte muito. Às vezes, ela passa perto de alguém com cabelos compridos demais ou com uma cor acentuada, e diz: “Que cabelo horrível!” Aí, a pessoa escuta e é só risos! rsrsrsrsrsr 
Todas a pessoas que conheci no meio autístico, todo amor incondicional que tenho por esta irmã, que nem sei de onde vem, e todas as lutas que nos trouxeram até aqui, sempre foram minhas maiores inspirações. 
Como todas as pessoas neste planeta, com suas variáveis, tenho momentos tristes e felizes e esta pequena retrospectiva me fez enxergar pessoas queridas só me dão a certeza de que tenho muito a me orgulhar e dizer que sou feliz! Cuidei de tantos e ainda tenho saúde e força para cuidar e lutar por mais alguém. Seja como for, levarei adiante esta causa que abracei e na certeza também que o mundo será melhor no que diz respeito aos autistas, pois, como eu na minha pequena contribuição, muitos corações e mãos se unem em favor destes, que como sabemos precisam de alguém para defendê-los e zelar por um futuro melhor. O meu lema para alcançar a tantos que como eu, um dia, nem imaginava como este mundo autista, apesar de grandes desafios, nos tornam pessoas melhores é poder compartilhar minhas histórias e ajudar outros a terem força nesta caminhada.
Bianca
Texto escrito por Anita Brito a partir de um questionário preenchido pela pessoa entrevistada. Caso deseje utilizar nossos textos, por favor citem a fonte. Obrigada.

10 comentários:

  1. Poxa, história realmente bacana... é meu primeiro contato com a história de um autista adulto. É Marlice, te desejo sempre mais força e paz para seguir com sua irmã. Grande abraço!

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    1. obrigada Carlos Oliveira!!! abraço Marlice

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  2. Emocionante! Parabéns por essa garra e continuar cuidando da Bianca!!!!!!Se todos tivessem alguém como você por perto, não precisaria sofrer tanto por um futuro que ainda está por vir! Que todos filhos autistas tenham a chance de encontrar pessoas boas como a Bianca está tendo!

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  3. Parabéns Marlice por sua história com a Bianca, os irmãos são grandes parceiros.
    Muita força na sua caminhada, e que ela se encha cada vez mais de flores.
    Abçs
    Claudia Moraes

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  4. Marlice, depois de ler a sua estória passei a te admirar ainda mais. Parabéns, você é guerreira mulher!!!

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  5. Marlice, meu respeito e admiração por sua força. Você é um exemplo para tantas mães que acabaram de diagnosticar seus filhos. Depoimento como estes nos fazem crescer. Obrigada por compartilhar sua história. Abraços e tudo de bom em sua vida e na vida de sua irmã, que é uma vencedora por ter esta família admirável que Deus Preparou. Beijos.

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  6. Ola Marlice, parabens pela pagina e pela iniciativa junto a Prefeitura. a sua Irma usa o computador ou tablets? Eu tenho vista muito progresso com o USO da tecnologia e fiquei curiosa. as fptos Sao lindas,mas nao consegui amp liar para ver melhor. Comoros posse fazer? Um abraco, Feliz 2013 luglazier@gmail.com

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  7. PARABENS MARLICE PELA LINDA HISTÓRIA , PRINCIPALMENTE POR BIANCA NÃO SER SUA IRMÃ BIOLÓGICA E VOCE TER TANTO AMOR E CARINHO E SE DEDICAR A CAUSA . MAIS UMA VEZ PARABENS DESEJO QUE (DEUS TE ABENCOE) E LHE MUITA SA[UDE EM TODOS OS SEUS DIAS.
    EU COMO MAE DE UM AUTISTA DE 26 ANOS SEI MUITO BEM COMO E VIVER A SITUACAO . UM BEIJO ENORME EM SEU CORACAO.

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  8. Marlice, parabéns pela sua luta. Tomei a liberdade de publicar seu blog na página O Cuidador no Facebook.
    Sou mãe de um rapaz com deficiência com 41 anos.
    Vai meu abraço carinhoso

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