sábado, 5 de janeiro de 2013

Cristiano Camargo


Cristiano e sua mãe, Dona Jaci
Conheçam Cristiano Camargo, escritor de 49 anos, Asperger. Cristiano escreve desde 1975, já publicou 05 obras e já venceu 03 concursos literários. Ele superou, sozinho, todas as “limitações” neurológicas e sociais que a síndrome lhe impôs. Cristiano é muito ativo nas comunidades relacionadas ao autismo e, no momento, está divulgando seu mais novo livro “Autista com muito orgulho – A síndrome vista pelo lado de dentro!”. Leiam este relato que traz um insight sobre como é ser um Asperger adulto.

            Sempre me achei diferente das outras pessoas. Aliás, ainda me acho diferente! Um dia, meu pai estava viajando pela Europa e começou a ler o livro “O Estranho caso do cachorro morto” (The curious incident of the dog in the night-time – Mark Haddon). Ao ler, ele achou que eu me parecia muito com o personagem principal, que é Asperger. Ao voltar da Europa, ele me levou a um psiquiatra especialista em Asperger, Dr. Marcos Mercadante, já falecido, que me diagnosticou. Foi o próprio Dr.Mercadante quem me deu a notícia do diagnóstico. Eu já estava com 41 anos.
Na hora que recebi o diagnóstico, a ficha demorou um pouco a cair. Eu já sabia há muito tempo que eu era diferente das outras pessoas e sempre gostei disto. Depois fiquei um pouco deprimido, mas fiz uma auto análise, repassei a minha vida toda na cabeça e cheguei a conclusão de que ser Asperger  era uma coisa boa, legal, um privilégio. Pensei que ser diferente, além de algo muito bom, me faria bem, então passei a ter orgulho de ser autista e continuei minhas superações, que já vinham em curso há vários anos.
Meu pai foi sem dúvidas o mais afetado, porém, positivamente. Passou a ser muito mais compreensivo e a se dedicar a me conhecer muito mais profundamente do que até então. Quanto a outros familiares e amigos, a reação foi nula: eles não mudaram seu comportamento para comigo, que continuou e continua sendo de superproteção e de condescendência. Já os amigos não se alteraram e continuaram a me tratar como sempre me trataram, com igualdade.
Frequentei escolas estaduais, particulares e já frequentei uma universidade federal e uma particular. Mas na minha época de estudante, não existia o diagnóstico de Asperger, então não precisei fazer inclusão em nenhuma das escolas o que, de certa forma, me ajudou muito, pois eu me auto-incluí, reagindo ao bullying e me dando ao respeito, de modo que depois do início da adolescência, nunca mais passei por bullying.
Eu acredito muito em qualidade de vida para os autistas. Tanto acredito que sou um ativista dedicado à Causa Autista/Asperger para mostrar para todos que nada disso é doença, transtorno, deficiência, desordem, etc, mas, sim, uma Diferença. E creio que esta diferença não nos torne inferiores a ninguém, mas nos provê um Diferencial marcante, que nos distingue positivamente da multidão, pois nos dá personalidade, uma capacidade incrível de superação, criatividade infinita, determinação férrea em superar e alcançar nossas aspirações, amadurecimento lindo e de qualidade. Enfim, estas são apenas algumas das qualidades e vantagens que o Autismo e a Asperger dão a quem tem o privilégio de fazer parte de sua natureza, de seu jeito de ser, de sua essência, alma e coração!
Já tive muitas conquistas em minha vida. Tantas, que fica difícil enumerar, afinal, superei todas as características que muitos impõem como se fossem negativas, “sintomas” ou “limitações”, tanto sociais como neurológicas. Hoje tenho, por exemplo, grande empatia pessoal, especialmente com as mulheres, sou muito desinibido em relação ao que os convencionalistas querem esperar de um Autista, ao ponto de muitas vezes ser confundido com um neurotípico, pelos próprios neurotípicos, mas que as aparências não enganem: por trás da aparência está uma alma, um coração, um âmago Autista, com todas as suas qualidades que este confere aos indivíduos. Eu também dirijo, tenho uma carreira literária de sucesso e me expresso muito bem Sou muito independente em meu comportamento e não crio dependências emocionais com ninguém.
Como todas as pessoas, tanto autistas como neurotípicas, tenho minhas frustrações e sensação de impotência. Sou igual a qualquer um neste aspecto, afinal, não dá para se dominar tudo e fazer tudo o que quiser, porque a sociedade tem regras que precisam ser obedecidas.Claro que tenho as minhas, como todo mundo, porém penso que a virtude não está em não se ter frustrações ou sensações de impotência, pois isto é impossível. Nem tudo é possível ou permitido, mas está sim, no modo maduro de se lidar com estas coisas, superando-as e continuando em frente sem olhar para trás e aprendendo com as lições que estas frustrações e impotências nos ensinam, mantendo, assim, a auto confiança e auto estima intactas. E é exatamente isso que faço.
As pessoas em geral, principalmente as não envolvidas em nenhum grau com o Autismo, precisam entender que Autismo não é doença, portanto, a busca por uma “cura” não tem sentido. Como “curar” alguém sadio? Autistas e Aspergers são pessoas psicologicamente sadias. O que as destaca é a Diferença, e o fato de terem Processos de Amadurecimento diferentes do relacionado aos Neurotípicos, ou seja, pessoas que a Sociedade rotula de “Normais”. Esta diferença em si não traz sofrimento ao Autista/Asperger, ,ao contrário, só benefícios! Esqueçam a velha imagem estereotipada de crianças autistas tristes, deprimidas, angustiadas. Isto é, na minha opinião, desinformação. É mais ou menos como os filmes de Hollywood que colocam Dinossauros e Homens das Cavernas na mesma história e muita gente ainda acredita que conviveram, enquanto quem é um pouco mais informado sabe que 61 milhões de anos separam as duas espécies. Autistas são pessoas alegres e felizes por Natureza. Quando imaturas, do ponto de vista de seus Processos de Amadurecimento psicológicos, elas são isoladas, mas é um isolamento feliz! Só vai se tornar infeliz no momento em que a sua imaginação passar a querer controlar sua mente, já na segunda fase de seu Processo de Amadurecimento. E é aí que necessitam de uma orientação bem feita de como superar e conduzir este processo. E temos de lembrar, também, que o que os pesquisadores chamam de “características” ou “sintomas” do Autismo/Asperger não são exclusivas para nós e todas estas características são perfeitamente superáveis. Nós temos todas as condições para amadurecer e superar para, assim, termos um futuro brilhante pela frente, como indivíduos produtivos e sociáveis.
De acordo com o que eu já pesquisei, o que existe de mais próximo de estar comprovado como causa do autismo é a herança genética. Porém, devo ressaltar que ficar tentando encontrar causas para o autismo é pura perda de tempo e nada útil, nem proveitoso e nada traz de positivo para os próprios autistas.O importante mesmo é se dedicar a orientá-los pelos seus Processos de Amadurecimento, acreditar neles e, especialmente, acreditar em seus sonhos, acompanhá-los e incentivá-los em suas superações.
Eu até passei por uma época de grande depressão, mas não por causa do autismo e, sim, por ter perdido a visão do olho esquerdo depois de uma operação malfeita. Foi uma época difícil em que, por alguns momentos, passaram-me pela cabeça pensamentos negativos sobre a vida e o autismo. Mas eu reagi e, após o apoio incrível dos meus amigos do Portal Mercedes na Internet, eu fiz outra auto análise e superei mais este obstáculo em minha vida. Mas fico chateado quando certas pessoas agem com preconceito comigo, tratando-me com condescendência e superproteção, agindo como se falassem com uma criança, e tratando-me como tal. Isto ainda acontece muito até hoje, especialmente com pessoas desconhecidas e ignaras.
Porém, os momentos felizes superam tudo isso. Um exemplo disso, foi quando eu fui o grande vencedor do V Prêmio Literário Arthur Bispo do Rosário, promovido pelo Conselho Regional de Psicologia do Estado de São Paulo, em que muita gente ali era autista ou pais de autistas e me aplaudiram muito depois de meu discurso. Isso foi, para mim, uma grande prova de superação e reconhecimento! Ganhei o primeiro lugar e mais duas menções honrosas!
Algo que gosto de lembrar e que acho engraçado era o tempo em que eu tive a minha cachorrinha Lune. Quando eu estava sozinho com ela, eu adorara cantar para ela canções em voz alta, geralmente bem alta, com letras que eu improvisava na hora e que eram bastante engraçadas. Muitas vezes as crianças dos vizinhos escutavam, não entendiam nada, e ficavam me imitando, mas eu nem ligava. As brincadeiras que eu fazia com a Lune eram muito divertidas também.
Creio que eu sempre tenha tido uma autoconsciência sobre o autismo e que isso me serviu de inspiração para minhas superações e auto análises. Precisamos, nós autistas, conseguir voz nas grandes mídias, em especial na Televisão através de seus diversos canais, para mostrar ao grande público que nossa índole é pacífica e sensível, que somos do Bem e da Paz, que absolutamente nada temos a ver com a Psicopatia, e que somos as principais vítimas das agressões, sejam físicas, psicológicas ou verbais, de outras pessoas, especialmente na covarde questão do bullying, que nada mais é do que a pura expressão da perversidade e falta de caráter.
Eu estou numa fase excelente da minha vida e posso afirmar, sem medo de errar, que sou uma pessoa feliz! Eu tenho um lema de vida que, penso, pode servir para inspirar todos os autistas e seus pais: “Tudo é impossível...até que seja tentado !”
Cristiano Camargo
Texto escrito por Anita Brito a partir de um questionário preenchido pela pessoa entrevistada. Caso deseje utilizar nossos textos, por favor citem a fonte. Obrigada.

8 comentários:

  1. Cristiano, sinto orgulho de você! Que continue com esta disposição de ultrapassar os limites que a sociedade lhe impõe! Você é formidável! Que Deus lhe abençoe sempre!

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  2. Parabéns Cristiano, pela história de superação, mas principalmente por querer ajudar as outras pessoas.
    Att,
    Claudia Moraes

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  3. Muito obrigado 'a Associação de Pais de Autista e Deficientes mMentais e também a Iza Flor,vcs são muito gentis e agradeço ao apoio e incentivo!A luta pela conscientização continua, e será longa, combater o preconceito e a discriminação contra o Autismo é um longo caminho, há muito que ser feito, não só por mim, mas por outros Aspergers e autistas assim como seus pais, associações e terapeutas relacionados 'a 'area, todos juntos nesta causa e luta conjunta,mas vamos fazer e vencer!

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  4. Cristiano,
    Obrigada por compartilhar sua história conosco, veio ao encontro do que acreditamos e desejamos para a nossa filha, Maria Clara, 4 anos autista.
    Como podemos adquirir seus livros?
    Carmen e Juliano

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  5. Estou lendo atentamente o livro "autista com muito orgulho" e de todas as matérias sobre o assunto as poderações que faz nos seus escritos superam em muito tudo o que li, principalmente no quesito CANDURA. A única clítica que faço é naquilo que escreveu que aparece próximo a foto com sua mãe, dizendo que superou todas as adversidades sozinho e isso você sabe que não é verdade não só no sentido físico como principalmente no espiritual. Considero-me tambem um aspie(marido da Ester e pai de um casal de filhos). Tenho atualmente 66 anos e o primeiro artigo so asperger que li foi por volta de Setembro de 2008 e daí então a fazer pesquisas e consultar profissionais de saúde mental, no entanto sua capacidade em escrever a referida síndrome é fenomenal. Levi J. Hessel. Continue! Parabens!

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  6. Olá!
    Meu nome é Ana Cristina Garantizado Rêgo moro em Maracanaú ce
    Gostaria de sua ajuda para elaborar minha Monografia. o assunto já tenho em mente q é falar sobre autista asperger. Se vc tiver algum material pode enviar para meu e-mail ana-rego@bol.com.br.
    Muito obrigada!

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  7. Parabéns!

    Pela superação e luta diária !

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